"Sou um homem comum
de carne e de memória
de osso e esquecimento.
e a vida sopra dentro de mim
pânica
feito a chama de um maçarico
e pode subitamente
cessar.
Sou como você
feito de coisas lembradas
e esquecidas
rostos e
mãos, o guarda-sol vermelho ao meio-dia
em Pastos-Bons
defuntas alegrias flores passarinhos
facho de tarde luminosa
nomes que já nem sei
bandejas bandeiras bananeiras
tudo misturado
essa lenha perfumada
que se acende
e me faz caminhar
(...) e não vejo na vida, amigo,
nenhum sentido, senão
lutarmos juntos por um mundo melhor (...)
Quero, por isso, falar com você,
(...) apoiar-me em você
oferecer-lhe o meu braço
que o tempo é pouco
e o latifúndio está aí, matando.
Que o tempo é pouco
(...) cruzo a Avenida sob a pressão do imperialismo.
A sombra do latifúndio
mancha a paisagem
turva as águas do mar
e a infância nos volta
à boca, amarga,
suja de lama e de fome.
Mas somos muitos milhões (...)
e podemos formar uma muralha
com nossos corpos de sonho e margaridas".
[Ferreira Gullar]
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