Qualquer dia, qualquer um desses, eu atiço fogo no mundo e escarro na cara daqueles que se acham donos dele.
Qualquer dia, quando acharem que não sou capaz de esboçar mais nenhuma reação, eu faço a revolução. Mudo minhas coisas de lugar e pinto uma parede de vermelho.
Qualquer desses dias - todos sempre iguais e intermináveis - eu testo a morte só pra ver como é: vou cortar as unhas depois do almoço e tomar manga com leite.
Em qualquer dia desses em que não há nada que fazer eu grito minha dor no ouvido de um surdo e peço para um mudo falar da minha tristeza para o mundo.
Quando menos se esperar, num dia qualquer de horas previsíveis, eu conto o que sei. Se não souber de nada - e eu nunca sei mesmo - eu invento o que não sei só para ter o que dizer.
Num dia que pode ser qualquer um não só farei de besta, como viro eu mesma a própria besta do apocalipse em carne e osso.
Qualquer dia quando estiver sentado na areia de uma praia que também pode ser qualquer uma eu me levanto e nado até onde o céu toca o mar.
Em qualquer dos 365 dias de qualquer ano eu vou de São Tomé das Letras a Machu Picchu atravessando uma caverna.
Qualquer dia eu componho uma música em compasso quartenário, faço uma poesia com rimas ricas e volto a tocar piano.
Qualquer dia eu te dou ouvidos. Qualquer dia tenho uma conversa franca com a lua. Qualquer dia eu me levo a sério. Qualquer dia eu digo que amo. Qualquer dia eu volto a rasgar páginas.
Qualquer dia pode ser daqui a cem anos. Qualquer dia pode ser ano que vem, na próxima semana ou amanhã. Qualquer dia pode não ser nunca, mas qualquer dia pode ser hoje também.
[jussara soares]
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